O IAB teve um primeiro papel fundamental para consolidar a profissão de arquitetos e urbanistas como atividade autônoma da engenharia lá nos anos 1940 e 1950. Organizou-se como instituição de representação, de agremiação espontânea dos arquitetos e de plataforma para as políticas do campo. Seja na direção de uma prática legítima sobre o construído, a paisagem, a cidade; seja sobre o ensino, a educação do arquiteto e da sociedade para esta atividade tão fundamental para a cidadania. Uma ação nestes diversos temas se iniciou com o apoio a regulamentação, em nosso país, da arquitetura como profissão (a criação do Crea/Confea, em 1933), depois com a organização do congresso de 1945, e no caso de São Paulo, com o incentivo para a Fundação da Faculdade de Arquitetura da USP, em 1948.
Os boletins são um registro importante do cotidiano institucional. Neles foi possível resgatar este espírito dos primeiros anos de fundação voltado à regulamentação, a distinção da profissão e a valorização da atividade de projeto como fundamento da arquitetura. Em São Paulo o colegiado foi fundado em 1943 e a inauguração da sua sede coincide com a 1ª Bienal Internacional de Arte, em 1951, marcando o papel fundamental do IAB/SP no cenário nacional da instituição.
Nos anos de 1972 e 1973 podemos ver registrado, por exemplo, o que a gestão de Paulo Mendes da Rocha divulgou. Um tempo difícil para o país, estávamos sobre o regime da ditadura militar onde a censura pesava sobre nossa sociedade, mas especialmente pesava sobre os intelectuais e as atividades artísticas e educacionais. Mas ao mesmo tempo, estes anos também foram os anos do milagre econômico, onde, em certa medida, o país viveu uma possibilidade de prosperidade econômica, e então, de maiores oportunidades profissionais.
Em meio a ações políticas de valorização da profissão, do amparo aos cursos de arquitetura e da discussão sobre a existência de uma crítica sistemática da arquitetura, a direção apontava que ainda não havia espaço para um debate amplo do campo. Mesmo assim, o IAB/SP de 72/73 criou uma comissão de imprensa e um jornal mensal, O ARQUITETO, cujo leque de interesses seriam a prática profissional, a relação sindical dos arquitetos e o campo cultural. Também estabeleceu o espaço de exposições permanentes, iniciado com uma mostra sobre a obra de Vilanova Artigas, depois Eurico Prado Lopes e Luís Telles.
Os boletins ainda traziam a agenda de concursos nacionais e internacionais, cursos, seminários e encontros da área e uma divertida seção de serviços com desconto para exames oftalmológicos e auxílio para fazer a declaração de imposto de renda. Uma instituição voltada para o amparo profissional e difusão das atividades da arquitetura para arquitetos.
Já nos anos 86/87, segunda gestão do Paulo Mendes da Rocha, os temas eram todos entorno da abertura política e da constituinte, das discussões estratégicas para o fortalecimento de pautas urbanas, da reforma agrária e do direito a moradia. Numa escala ampliada de questões, os boletins fortaleciam a democracia também em outros países da América Latina, como o Chile, mostrando diálogos internacionais. Os boletins traziam muitas vezes o tema da independência política do IAB nos debates constituintes e a crítica da falta de representantes para as pautas urbanas. Foi o tempo da criação da Fundação Vilanova Artigas, das discussões sobre a informatização dos escritórios, dos debates sobre tombamento de nosso patrimônio construído com a participação no Condephat, e ainda, da deliciosa notícia da reabertura do Bar do IAB.
Nas gestões de 2012 a 2016 de José Armênio de Brito Cruz, os boletins não estão disponíveis, ainda. Entretanto, podemos lembrar algumas questões relevantes: foram duas gestões marcadas por uma geração mais nova de arquitetos, em comparação com as anteriores, outras cabeças. Também esta gestão foi marcada pela revolucionária Bienal de Arquitetura - "Cidades: modos de fazer, modos de usar", que explodiu o ambiente expositivo para o território da cidade. Mas contudo, um período marcado pela luta para sanar as dívidas da instituição e o esvaziamento da filiação dos arquitetos. Provavelmente em função dos rearranjos institucionais com a fundação do CAU em 2014, ou mesmo da despolitização que o pragmatismo liberal da profissão vem sofrendo desde os anos 90.
Diante destes contextos, cabe aqui colocar alguns pontos para nosso debate, que deve continuar após as comemorações do aniversário da instituição:
Primeiramente, passado os anos de luta pela consolidação profissional, de fortalecimento dos temas urbanos e de habitação social até os anos 1960; depois, durante a ditadura, o cerceamento dos debates e, então, a abertura de 1985 e o fortalecimento da profissão na pauta das politicas urbanas, vemos uma trajetória de consolidação do estatuto profissional mas um distanciamento de algumas práticas que marcaram as décadas iniciais do IAB. Por exemplo, a integração de um cotidiano de discussões e formulação de pautas comuns entre arquitetos e artistas plásticos, cineastas, músicos e teatrólogos promovida, em parte pelo convívio no clubinho. Estes encontros deixam uma memória de que arquitetos paulistas estavam mais integrados com a intelectualidade artística e portanto promovendo uma profissão mais próxima da cultura cotidiana, menos ensimesmada. Certamente todos ganhariam muito se conseguíssemos resgatar estes diálogos.
Depois também nestes anos desde a primeira gestão do Paulo Mendes da Rocha, o número de mulheres arquitetas cresceu exponencialmente. De modo bem rápido, constatamos que as arquitetas estão envolvidas com o trabalho nos escritórios, no interior das instituições ligadas aos problemas urbanos, sejam autarquias, secretarias, associações, ongs, ou mesmo no ensino, e, na gestão de projetos de grande escala. É importante lembrar que aqui no Brasil, assim como em outros países, ainda estamos diante de um quadro bastante desigual de salários ou espaço para a publicação e documentação desta silenciosa participação na história da arquitetura. Quais seriam as ações do Instituto diante deste público que pudessem colaborar com uma diminuição das desigualdades de gênero dentro da nossa profissão?
Conhecer a história do IAB é um passo importante para reconhecermos a luta de profissionais aptos a enfrentar os reais problemas de nossos centros urbanos e ao mesmo tempo renovar a pauta institucional repensando seu propósito e respeitando suas conquistas. Como disse Paulo Mendes da Rocha naquela noite: que venham os jovens e os próximos 75 anos.